Artigo: Lei do Stalking: dois anos protegendo vidas

Leila Barros – Senadora e procuradora especial da mulher no Senado

A modelo piauiense Rayanne Adorno enfrenta ansiedade, crises de pânico e dificuldades em se relacionar, dormir e se alimentar. Ela passou a desenvolver esses sintomas após ser vítima do crime de perseguição, também chamado de “stalking”. Seu algoz, o francês Malik Roy, foi preso em julho de 2022. Graças à aprovação de uma lei de minha autoria, a chamada “Lei do Stalking” (nº 14.132/21), que entrou em vigor no dia 1º de abril de 2021, esse tipo de crime deixou de ter uma pena branda.

Após dois anos em vigor, a “Lei do Stalking” tem se constituído em ferramenta essencial no combate ao feminicídio no Brasil. Denunciar esse tipo de assédio pode evitar que um caso de perseguição evolua para violência ou até mesmo tragédias de proporções maiores. Divulgar informações sobre o “stalking” e a legislação ajuda as mulheres a se protegerem. Conhecer e utilizar a lei quando necessário pode representar a diferença entre a vida e a morte de uma vítima.

Em 2021, mais de três casos similares ao de Rayanne ocorreram por hora no Brasil. No total, 27,7 mil denúncias de “stalking” foram recebidas naquele ano pelas polícias dos 22 estados brasileiros que divulgaram os dados incluídos no Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022. Contudo, esses números não representam a totalidade, pois a legislação era recente e em 2021 alguns estados ainda não contabilizavam essas ocorrências.

As mulheres são as vítimas mais frequentes, e as principais causas da perseguição são o final de um relacionamento ou a negativa em iniciá-lo. Várias vezes, o assédio começa por meio de mensagens ou comentários nas redes sociais e vai se intensificando até que a vítima se sinta encurralada. Frequentar locais nos mesmos horários da vítima para impor sua presença, rondar a casa, fazer ligações telefônicas e mandar mensagens insistentes que imponham medo são algumas das práticas criminosas que mais se repetem.

É imprescindível que a pessoa relate a situação a amigos e parentes, e não interaja com o perseguidor. Ela também deve bloquear imediatamente aquele contato, tirar “prints” dos ataques ou gravar as evidências da perseguição e denunciar à polícia e aos responsáveis pelas redes sociais. Também é necessário procurar uma delegacia especializada em crimes virtuais ou delegacia da mulher, se a vítima for do sexo feminino.

A “Lei do Stalking” é um símbolo de esperança para as vítimas que lutam por justiça e uma mensagem clara aos perseguidores de que a sua conduta criminosa não será tolerada. Resolvi estudar uma forma de alterar a legislação para proteger as vítimas desse tipo de assédio após assistir reportagem do programa Fantástico (Rede Globo), veiculada em março de 2019. Entre outros, a matéria tratou do caso da radialista Verlinda Robles, que foi obrigada a fugir do Mato Grosso do Sul após ser perseguida implacavelmente durante dois anos. Na época, o “stalking” já era crime em países como França, Itália, Alemanha, Índia, Holanda, Canadá, Portugal, Reino Unido e Estados Unidos. Somente após a aprovação da “Lei do Stalking”, o perseguidor de Verlinda foi condenado a dois anos de prisão.

Quem desrespeitar a lei pode ser condenado a até dois anos de prisão, com agravantes se a vítima for criança, adolescente, idosa ou mulher. Antes de a nossa Lei ser aprovada, quando não havia uma tipificação exclusiva no Código Penal, a prática de perseguição costumava ser enquadrada como ameaça. A pena era muito branda: era apenas de um a seis meses de prisão. Muitos casos eram tratados como contravenção penal leve por perturbação da tranquilidade da vítima, punida com detenção de 15 dias a dois meses.

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