Debate no Senado acende alerta para mudanças em leis de proteção da água


A crítica situação das águas no Distrito Federal foi colocada em pauta durante audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado nesta quarta-feira (27). Os principais desafios apontados pelos debatedores foram os riscos que a contaminação e o crescimento desordenado da capital causam ao abastecimento hídrico do país. A reunião, convocada pela presidente da CMA, senadora Leila Barros (PDT-DF), reuniu especialistas, acadêmicos e autoridades governamentais para discutir soluções diante da ameaça à segurança hídrica.

A parlamentar brasiliense abriu o encontro salientando a gravidade da situação e o papel do Cerrado como pilar na regulação hídrica do Centro-Oeste e de outras áreas do país. O bioma é responsável pela geração de 43% da disponibilidade hídrica do país, sendo o berço das águas que abastecem importantes rios que cruzam o Brasil de Norte a Sul, como o Paranaíba, Tocantins e São Francisco.

“O desmatamento do Cerrado, a ocupação desordenada do solo e a poluição dos nossos rios e mananciais são questões urgentes que demandam nossa atenção e ação imediata,” afirmou a senadora.

senadora leila

O Distrito Federal enfrenta uma série de desafios únicos devido às suas numerosas nascentes e à sua posição como uma importante área de recarga de aquíferos. Entretanto, a contaminação por mercúrio e outros poluentes, como evidenciado por estudos da Universidade de Brasília (UnB), joga luz sobre a urgente necessidade de revisão e fortalecimento da legislação ambiental vigente para proteger esses recursos vitais. Este cenário é agravado por um acelerado crescimento populacional, as mudanças climáticas e uma grave crise hídrica que levou a sociedade a racionar o recurso natural em 2017.

Saúde dos rios do DF

José Francisco Gonçalves Júnior, professor do Departamento de Ecologia da UnB, trouxe dados alarmantes sobre a saúde de 52 rios do Distrito Federal, apontando um processo acelerado de envelhecimento devido ao desgaste ambiental. A legislação atual, segundo o professor, mostra-se insuficiente para a proteção dos rios contra a poluição por determinadas substâncias, evidenciando uma lacuna no que tange aos compostos químicos emergentes, tais como fármacos e microplásticos.

Gustavo Antônio Carneiro, superintendente de Recursos Hídricos da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), concordou sobre a necessidade de atualizar a legislação ambiental para enfrentar os desafios impostos pelos novos poluentes. “A lei carece de inovações para tratar de poluentes persistentes e outros contaminantes presentes no nosso ciclo diário,” salientou Carneiro.

Um estudo coordenado por José Vicente Bernardi, do programa de pós-graduação em Ciências Ambientais da UnB, apontou a contaminação por mercúrio na Estação Ecológica Águas Emendadas. A unidade de conservação é uma das reservas naturais mais importantes da América Latina. Na região ocorre o fenômeno da união de duas grandes bacias hidrográficas do continente, a Tocantins/Araguaia e a Platina, em uma vereda de 6 km de extensão. As águas que ali brotam correm em direções opostas.

Bernardi alertou para a presença de metais pesados oriundos das rodovias que passam próximas à Estação das Águas Emendadas, todas acima dos limites estabelecidos pelo Conama, enfatizando o grave legado ambiental deixado pela infraestrutura viária.

“São metais pesados oriundos da rodovia, do pneu, da combustão, do próprio asfalto. Todos esses metais pesados, todos eles, estão acima do limite estabelecido pelo Conama. Isso vai para o corpo d’água. Não tem como segurar. São vários: arsênio é elevado, cádmio é elevado, mercúrio é elevado. É o legado que a rodovia está deixando” afirmou.

José Vicente Bernardi

Marcelo Benini, coordenador da Associação Guardiões das Águas Emendadas, criticou a permissividade governamental diante da monocultura ao redor da reserva natural, enquanto Lúcia Mendes, do Fórum de Defesa das Águas do Distrito Federal, chamou atenção para os impactos da exploração fundiária e do modelo de agricultura predominante sobre a qualidade da água.

Por fim, Renato Santana, subsecretário de Meio Ambiente do Distrito Federal, reconheceu a responsabilidade do poder público na ocupação desordenada do solo e defendeu a criação de um cinturão verde como medida mitigatória.