Crédito de Carbono: entenda como funcionará a regulamentação do mercado

Brasil discute regulamentação do mercado de carbono para empresas que emitem mais de 10 mil toneladas de Gases do Efeito Estufa. O projeto de lei prevê que empresas terão cota de emissão e poderão comprar créditos de carbono para compensar excedentes.

A presidente da Comissão de Meio Ambiente, senadora Leila Barros (PDT-DF), apresentou nesta terça-feira (20) um novo subtitutivo do projeto de Lei 412/2022, que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), responsável por estabelecer regras que se aplicam às atividades produtivas que emitem gases de efeito estufa e regula o mercado de créditos de carbono no Brasil.

O SBCE faz parte dos esforços do governo brasileiro para se adequar às diretrizes do Acordo de Paris e para se posicionar como protagonista na busca por soluções inovadoras e sustentáveis para reduzir as emissões e retirar da atmosfera os gases do efeito estufa (GEE), que têm desencadeado eventos climáticos extremos, como tempestades, secas prolongadas e desastres naturais, que tiram a vida de milhares de pessoas a cada ano.

O relatório de Leila é favorável ao projeto e apresenta mudanças no texto aprovado pela Comissão de Assunto Econômicos do Senado no ano passado. De acordo com Leila, essa é a proposta mais sólida e equilibrada que o Congresso Nacional analisou para implementar o mercado de carbono. “O projeto estabelece o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) de forma completa, indicando as diretrizes de funcionamento, definindo os mecanismos de governança e prevendo as regras gerais que proporcionarão segurança jurídica para empresas e credibilidade para os créditos de carbono gerados no Brasil”, ressalta Leila. “Tudo isso de forma abrangente e flexível, permitindo que ajustes contínuos sejam feitos em regulamentações específicas.”

A medida também estabelece que instalações que produzem grandes volumes de GEE deverão seguir regras para reduzir a emissão de carbono. A regulamentação do mercado de carbono dará segurança jurídica para as empresas brasileiras, investidores estrangeiros e, ainda, fortalecerá de forma indireta o mercado voluntário de créditos de carbono, oriundos de projetos de redução ou remoção de GEE como, por exemplo, por meio de reflorestamento.

Governança

O PL 412/2022 estabelece e define o papel de cada um dos entes que vão compor a governança do SBCE. Esse mecanismo contará com um órgão deliberativo (Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima), um órgão gestor (autarquia que será criada) e um grupo técnico permanente, que excerá o papel de órgão consultivo para fornecer subsídios técnicos e apresentar recomendações de aprimoramento do funcionamento do mercado brasileiro de carbono. Esse grupo será formado por representantes do Poder Executivo federal, dos Estados, de entidades setoriais, da academia e da sociedade civil. A composição e as regras de funcionamento deles serão definidas por um ato do Poder Executivo Federal.

Quem se enquadra nas regras do SBCE?

As regras do mercado regulado de carbono valem para empresas que emitem acima de 10 mil toneladas de gases do efeito estufa. Essas companhias terão de, anualmente, apresentar ao órgão gestor do SBCE um plano de monitoramento e relato de emissões e remoções de gases de efeito estufa. Já as instalações que emitem mais de 25 mil toneladas de gases do efeitos estufa por ano, além de atender a todos os regramentos anteriores, vão receber uma cota que estabelecerá um limite para emissão de GEE na sua linha de produção. Se, ao final do período medido, a instalação extrapolar esse limite ela terá buscar cota excedente de outra instalação que emitiu quantidade menor que a sua cota de GEE e/ou adquirir créditos de carbono reconhecidos no SBCE.

Em quanto tempo o mercado regulamentado estará funcionado?

O texto explicita que nos primeiros 12 meses após a sanção da Lei que cria o SBCE deverá ser editada a regulamentação para implementar o funcionamento do mercado de carbono. Esse prazo poderá ser prorrogado por mais 12 meses. Superado esse período, haverá mais 12 meses de trabalho para que as empresas possam começar a operacionalizar os instrumentos de relato das emissões de GEE.

Na terceira fase de implementação do SBCE, durante dois anos, as instalações emissoras de gases de efeito estufa estarão sujeitas somente ao envio do plano de monitoramento e de apresentação de relato de emissões e remoções de gases de efeito estufa. A partir de então, na quarta etapa, o SBCE poderá elaborar e implementar o Plano Nacional de Alocação, que tem vigência de um ano. Ao fim dos primeiros 12 meses de validade desse plano, se encerrará o período transitório de implementação do SBCE e marcará o início do funcionamento pleno do mercado regulado de carbono no Brasil.

O que é o Plano Nacional de Alocação?

O Plano Nacional de Alocação estabelecerá o limite máximo de emissões; a quantidade de Cotas Brasileiras de Emissões a ser alocada entre as instalações, as formas de alocação das Cotas Brasileiras de Emissões; o percentual máximo de Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões admitidos na conciliação periódica de obrigações; e a gestão e operacionalização dos mecanismos de estabilização de preços dos ativos. O Plano terá abordagem gradual entre os consecutivos períodos de compromisso, assegurada a previsibilidade para os operadores, e deverá ser aprovado com antecedência de pelo menos 12 (doze) meses antes do seu período de vigência.

Infrações e penalidades

O projeto também estabelece penalidades para as istalações que infrigirem as regras aplicáveis ao SBCE. Essas infrações administrativas serão estabelecidas em ato específico do órgão gestor do mercado regulado de carbono. As punições vão desde advertência; multa; embargo de atividade, fonte ou instalação; suspensão parcial ou total de atividade, de instalação e de fonte; e restrição de direitos (suspensão de registro, perda de benefícios fiscais, proibição de contratar com a administração pública).

O sistema de apuração de infrações vai obedecer um rito estabelecido no projeto de Lei 412/2022. O órgão gestor do SBCE deverá instaurar processo administrativo, assegurando direito à ampla defesa e contraditório, com prazo de 30 dias. Na aplicação das sanções, a autoridade competente deverá observar: a gravidade do fato, os antecedentes do infrator; a reincidência, a situação econômica do infrator; a boa fé; a vantagem ilícita auferida ou pretendida; a cooperação do infrator; a pronta adoção de medidas corretivas; e a proporcionalidade entre a gravidade da falta e a intensidade da penalidade.

Agro no mercado de carbono

Um dos setores que mais contribuiu para o aperfeiçoamento do texto apresentado pela senadora Leila Barros foi o agronegócio brasileiro. O relatório de Leila contempla algumas das demandas sugeridas por parlamentares da bancada ruralista no Senado.

É o caso, por exemplo, de emendas apresentadas pelo senador Zequinha Marinho (PODEMOS-PA). Uma delas permite que a recomposição de Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal ou de uso restrito, conforme exigidas pelo Código Florestal, seja atividade elegível para a constituição de créditos de carbono.

Incorporar essas áreas no mercado regulado de carbono reconhece e incentiva o cumprimento de regulamentações existentes no Brasil. A medida incentiva os proprietários rurais e agricultores a adotarem práticas de conservação de terras e a se comprometerem com a preservação ambiental.

Outra emenda de autoria do membro da Frente Parlamentar da Agricultura acatada pela relatora é a que permite a criação de ativos reconhecidos pelo SBCE a partir das remoções líquidas de GEE (saldo das emissões brutas subtraídas as remoções por sumidouros de carbono). Esses saldos são obtidos, principalmente a partir de atividades florestais e práticas agrícolas de captura de carbono. Ao permitir que as remoções líquidas sejam contabilizadas como ativos, o SBCE estimula a conservação e a restauração de ecossistemas florestais e solos agrícolas.

A bancada ruralista também apresentou emenda para excluir do regulamento do SBCE os operadores da agropecuária, bem como as atividades relacionadas ao uso alternativo do solo que forem desenvolvidas no interior de imóveis reurais. A principal argumentação é de que as emissões de carbono na agropecuária primária podem variar significativamente de ano para ano devido a fatores climáticos, sazonalidade, práticas agrícolas e de manejo. O que tornaria difícil estabelecer metas fixas e justas de redução de emissões para esse setor.

Leila incluiu no texto um artigo prevendo que o cumprimento de metas do Plano Nacional de Alocação se aplica apenas às atividades para as quais existam metodologias de mensuração, relato e verificação consolidadas, conforme definido pelo órgão gestor do SBCE para o cálculo de emissões e remoções. Além disso, estabeleceu que a elaboração do Plano poderá considerar ainda fatores específicos aplicáveis a cada tipo de atividade em particular.

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