O Plenário do Senado concluiu nesta quinta-feira (4) a votação da PEC Emergencial (PEC 186/2019), que promove uma reforma fiscal e permite ao governo federal pagar o auxílio emergencial em 2021 por fora do teto de gastos do Orçamento e do limite de endividamento do governo federal. Aprovada em segundo turno, a proposta segue para a Câmara dos Deputados. O valor, a duração e a abrangência do novo auxílio ainda serão definidos pelo Executivo.
No entanto, o programa ficará limitado a um custo total de R$ 44 bilhões. Durante a votação, senadores rejeitaram um destaque que pedia a supressão do limite. Foram 55 votos contra o destaque. Eram necessários 49 votos. Um deles foi da senadora Leila Barros (PSB-DF). Ela destacou que o limite reduzirá drasticamente o valor da parcela do auxílio emergencial que era de R$ 600 em 2020. Nos cálculos de parlamentares, a parcela ficará entre R$ 150 e R$ 200.
“Alguém aqui tem a coragem de afirmar que a pandemia estará controlada e que nós voltaremos à normalidade em três ou quatro meses? Certamente voltaremos a discutir uma nova PEC sobre o auxílio. Esse limite só serve para dar ao Governo a desculpa de dizer que a culpa desse valor é culpa do Congresso. É praxe desse Governo colocar culpa nos Prefeitos, nos Governadores, no Congresso, nos Poderes”, disse. (Assista a fala completa no vídeo ao lado.
A PEC permite que o auxílio emergencial seja financiado com créditos extraordinários, que não são limitados pelo teto de gastos. As despesas com o programa não serão contabilizadas para a meta de resultado fiscal primário e também não serão afetadas pela chamada regra de ouro — mecanismo que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, de custeio da máquina pública.
Reforma fiscal
A PEC impõe medidas de contenção fiscal para compensar o aumento de despesas. A principal delas são dispositivos a serem acionados quando os gastos do poder público atingirem um determinado patamar. Esses “gatilhos” passam a ser permanentes e válidos para todas as situações de estado de calamidade pública decretadas oficialmente, e não restritos à pandemia de covid-19.
Durante a votação da proposta, a oposição fez uma série de tentativas de retirar do texto as contrapartidas fiscais propostas pelo governo por meio de destaques, todos rejeitados. A derrota dessa estratégia levou senadores da oposição a votarem contra a PEC, mesmo sendo a favor do auxílio emergencial viabilizado por essa proposta.
“A prioridade do governo neste momento deveria ser o auxílio emergencial. Mas aproveitaram a grave crise que vivemos para promover novos e duros ajustes fiscais no País, sem que tenhamos tido a oportunidade de debater seus efeitos e consequências com a nossa sociedade”, apontou a senadora Leila. “Por isso, eu defendo de forma enfática todas as sugestões, sejam através de emenda ou de destaques, que buscam tratar exclusivamente do auxílio emergencial, deixando os demais temas relacionados aos ajustes fiscais para um debate posterior e presencial, na CCJ desta Casa.”
A parlamentar do Distrito Federal, no entanto, reconheceu que o texto aprovado foi amenizado. O relator da proposta, senador Marcio Bitar, acatou emendas da senadora Leila que teriam profundos impactos na educação, na saúde e nos investimentos do BNDES em empresas nacionais.
Na primeira emenda, Leila pedia que fosse retirado do texto a previsão de acabar com os investimentos mínimos em saúde e educação que estão previstos na Constituição Federal. A União, estados e municípios ficariam desobrigados a investir no ensino superior, afetando as universidades públicas e institutos federais e diminuindo a complementação federal ao Fundeb, aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro de 2020
Outra emenda de Leila acatada pelo relator da PEC Emergencial retirou do texto aprovado o trecho que revogava a determinação de que 28% dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) sejam destinados ao BNDES. O FAT é a principal fonte de recursos do BNDES e é alimentado pelas contribuições do PIS/Pasep. Os recursos que vão para o banco são emprestados a empresas com o objetivo de estimular o desenvolvimento do país.
Os gatilhos
Na esfera federal, todas as vezes em que a relação entre as despesas obrigatórias sujeitas ao teto de gastos e as despesas totais superar 95%, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e o Ministério Público deverão vedar aumento de salário para o funcionalismo, realização de concursos públicos, criação de cargos e despesas obrigatórias, concessão de benefícios e incentivos tributários e lançamento de linhas de financiamento ou renegociação de dívidas.
Os estados e municípios estão sujeitos à mesma regra dos 95%, porém apenas de forma facultativa. No caso desses entes da federação, também será possível acionar as medidas de contenção de gastos quando a relação entre as despesas correntes e as receitas correntes (impostos e contribuições) atingir 85%. Nesse caso, a implementação dependerá apenas de atos do Executivo, com vigência imediata.
A PEC também traz a previsão de diminuir incentivos e benefícios tributários existentes. Segundo o texto, o presidente da República deverá apresentar, em até seis meses após a promulgação da emenda constitucional, um plano de redução gradual desse tipo de benefício. São feitas exceções a programas como o Simples, o subsídio à Zona Franca de Manaus e a produtos da cesta básica e o financiamento estudantil para alunos do ensino superior.
Segundo o texto, será permitido o uso do superávit financeiro de fundos públicos para pagar a dívida pública de União, estados e municípios. Se não houver dívida a ser paga, o recurso poderá ser aplicado livremente.
Desvinculação de receitas
A PEC também muda regras para vinculação de receitas, liberando fatias do Orçamento que hoje são destinadas exclusivamente a certas áreas. Atualmente, a Constituição proíbe a vinculação de receitas tributárias, com algumas exceções. A proposta mexe nessa estrutura, estendendo a proibição para todos os tipos de receita e expandindo as exceções.
Uma ressalva que desaparece é a que permite a vinculação de receitas para serviços de administração tributária — dessa forma, essa vinculação passa a ser proibida. Foram excluídos dessa previsão o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), Fundo Nacional Antidrogas (Funad), Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé) e Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal.
Receitas de interesse da defesa nacional e as destinadas à atuação das Forças Armadas também não terão recursos desvinculados.
Outros pontos da PEC
– Inclui os gastos com pessoal inativo e pensionistas no teto de despesa dos Legislativos municipais. Atualmente, esse teto inclui os subsídios dos vereadores, mas exclui gastos com inativos. A despesa não pode ultrapassar o somatório da receita tributária e das transferências constitucionais.
– Inclui os pensionistas entre as despesas com pessoal que não podem exceder os limites estabelecidos em lei complementar. Atualmente, a Constituição prevê apenas que a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos estados, do DF e dos municípios não pode ultrapassar esse limite, sem mencionar os pensionistas.
– Inclui no artigo constitucional que trata da administração pública a determinação de que órgãos e entidades façam, individual ou conjuntamente, uma avaliação das políticas públicas e divulguem os resultados.
– Veda a transferência a fundos de recursos oriundos dos repasses feitos aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, os chamados repasses duodecimais. Se houver sobra de recursos, ela deve ser restituída ao caixa único do Tesouro do ente federativo ou será deduzida das próximas parcelas de repasse.
– Inclui na lei a previsão de uma lei complementar para regulamentar a sustentabilidade da dívida pública. Essa lei deverá especificar indicadores de apuração; níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida; trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação; medidas de ajuste, suspensões e vedações; e planejamento de alienação de ativos com vistas à redução do montante da dívida. A lei poderá autorizar ações de ajuste fiscal em caso de crise nas contas públicas. União, estados, Distrito Federal e municípios também deverão conduzir suas políticas fiscais de forma a manter a dívida pública em níveis que assegurem sua sustentabilidade, conforme a ser estabelecido pela lei complementar.
– Modifica o texto constitucional que trata da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para determinar que cabe a ela estabelecer as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância com trajetória sustentável da dívida pública. Inclui um parágrafo para determinar que as leis de que trata o artigo 165 da Constituição (Plano Plurinual, LDO e Lei Orçamentária Anual) devem observar os resultados do monitoramento e da avaliação das políticas públicas.
– Estende de 2024 para 2029 o prazo para que estados e municípios paguem seus precatórios.
Com informações da Agência Senado