Senadora Leila defende alternativas sustentáveis para o mercado de carbono

Os povos tradicionais devem ter mais participação na definição de regras para o mercado de carbono, afirmaram nesta quarta-feira (28) os especialistas convidados pela Comissão de Meio Ambiente (CMA). Na última audiência pública do ciclo de debates para a instrução dos projetos de lei que tratam da regulamentação do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), a comissão reuniu-se para ouvir especialistas que, em sua maioria, defendem a regulamentação, mas com uma participação mais efetiva das comunidades envolvidas.

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Presidente da CMA e relatora do PL 412/2022, a senadora Leila Barros (PDT-DF) disse ser “imperativo” encontrar “soluções viáveis e sustentáveis” para a questão. Pelo PL 412/2022, empresas ou atividades poderão neutralizar suas emissões de gases que provocam o efeito estufa a partir da compra de créditos de iniciativas “verdes”. Tramitam em conjunto o PL 2.122/2021, do senador Weverton (PDT-MA); o PL 3.606/2021, do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB); o PL 4.028/2021, do senador Marcos do Val (Podemos-ES); e o PL 1.684/2022, do senador Jader Barbalho (MDB-PA). As propostas tratam da mesma matéria, ao prever a regulamentação do mercado brasileiro de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE).

O senador Wellington Fagundes (PL-MT) levantou preocupações como quanto aos benefícios diretos às comunidades locais e à participação de pequenas e médias propriedades no mercado de carbono.

A assessora para Políticas Públicas Socioambientais do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Tatiana Oliveira, afirmou que, para se ter um mercado regulado, é preciso garantir uma ampla participação social em todas as etapas de discussão por todos os sujeitos políticos potencialmente atingidos por ele. “A transparência e o acesso à informação também são fundamentais” , disse Tatiana. Ela ressaltou ainda que no mercado voluntário — que há algum tempo está em funcionamento no país — tem havido desrespeito aos povos tradicionais e originários. “Precisa dar mais peso ao posicionamento da sociedade civil. (…) Regular significa proteger e garantir a realização progressiva de direitos, não é um exercício que se limita a estruturação do mercado.”

Consulta aos moradores

A reclamação também foi posta pelo presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Júlio Barbosa que também denunciou que empresas estão negociando no mercado voluntário a partir de áreas que pertencem ou são ocupadas por comunidades, como a dos extrativistas na Amazônia. Barbosa ressalta que qualquer projeto de comercialização de crédito de carbono em áreas de comunidades ou terras coletivas tem de passar por consulta local com os moradores.

Do Observatório do Clima, Shigueo Watanabe Júnior lembrou que esse “não é um mercado de ganha, ganha”. Há objetivos macros, como por exemplo, eliminar a queima de combustíveis fósseis, e para isso setores e atividades terão de se transformar. Watanabe Júnior afirmou ainda que esse é um mercado criado com o objetivo explícito de desaparecer um dia, quando se conseguir atingir as metas de redução de emissões globais.

Advogado membro do Grupo Carta de Belém, Pedro Martins defendeu que a aprovação da regulamentação “não pode cair na urgência da COP 30” (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) — que deverá ocorrer em Belém, em 2025. “O PL 412 traz a demanda fundiária. (…) E qual a situação que temos no avanço da questão fundiária, na regularização das terras indígenas?”, questionou o debatedor.

Outros países

De acordo com a diretora do Departamento de Clima do Ministério das Relações Exteriores, Lilian Chagas de Moura, o Brasil já está sendo procurado por outros países, mas tratativas ainda não acontecem por ainda não estar institucionalizada a regulamentação. Por isso, defende a gestora, a regulamentação do mercado doméstico precisa estar em linha com o que está sendo decidido internacionalmente e precisa ajudar o Brasil a cumprir sua meta NDC (sigla em inglês para Contribuição Nacionalmente Determinada). Apenas Brasil e Ilhas Marshall têm hoje NDCs que abrangem todos os setores. “O Brasil é responsável por 3% das emissões globais, mas quer fazer parte desse esforço mundial para resolver o problema. (…) Damos todos os sinais internacionais de que queremos participar”, afirma Lilian.

Ela lembra que o Brasil é um dos países que mais vai perder com o aquecimento global, sendo “um dos primeiros a sentir os efeitos das altas temperaturas e dos efeitos climáticos”. Lilian de Moura lembrou que o “objetivo central é controlar e reduzir as emissões de gases do efeito estufa para controlar o aquecimento global”. Por isso, reforçou a ministra, é muito importante que essa regulamentação seja bem fundamentada, de forma a contribuir na contenção da mudança do clima.

Reflorestamento

De acordo com a gerente de Sustentabilidade no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Marta Bandeira, o Brasil poderia captar cerca de US$ 20 bilhões com base na redução de desmatamento entre 2006 e 2015, porém só captou US$ 2 bilhões. Ela lembrou que a meta da NDC é restaurar 12 milhões de hectares de florestas e implementar 5 milhões de hectares de ILPF, até 2030, além de recuperar mais de 5 milhões de pastagens degradadas até 2020.

“O mercado de carbono pode viabilizar essa meta. (….) Podemos vender esse crédito de carbono e aplicar em atividades perenes”, afirmou Marta Bandeira.

Preço do carbono

Há hoje 75 instrumentos de precificação de carbono implementados em todo o mundo, segundo a diretora Socioambiental do Fórum de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Setor Elétrico (FMASE), Julia Sagaz. Ela destacou que as experiências internacionais que o mercado tem ser gradual e faseado para que os atores aprendam a trabalhar com o processo. “É preciso que o sistema não coloque tudo dentro da lei, que deixe muita coisa para regulamentação, para que conforme a gente for vendo que as coisas não estão dando certo, a gente possa voltar atrás e fazer ajustes no decorrer do processo”, disse.

O mercado voluntário de mercado de carbono tem regras e padrões bem diversificados, enquanto o regulado terá obrigações legais. No Brasil defende-se o modelo cap and trade, “em que é definida uma quantidade máxima de emissões de gases de efeito estufa aos agentes regulados e são emitidas permissões de emissão equivalentes”. Para o mercado global, foram aprovadas regras na COP 26, detalhadas na COP 27, mas que depende de cumprimento da NDC de cada país. A demanda é considerada incerta.

Mercado voluntário

Apesar de serem diferentes, os mercados voluntário e regulado de crédito de carbono devem se comunicar, segundo o líder do grupo de trabalho da Aliança Brasil NBS, Tiago Ricci. “É importante que os ativos do voluntário possam ser aceitos no mercado regulado”, disse Ricci. Para ele, há uma dificuldade no texto do projeto de lei em diferenciar esses dois modelos e não se pode “buscar uma limitação do mercado voluntário”. Hoje, 70% do crédito de carbono no mercado voluntário florestal está na Aliança Brasil NBS, que congrega 24 instituições. Isso representa a redução de 6 milhões de toneladas de CO2 e equivalentes, segundo seu representante.

Para o pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Gustavo Barbosa Mozzer, o mercado de carbono precisa ser olhado como um catalizador. “Um instrumento que nos ajude a avançar de maneira estratégica para esse objetivo de uma economia mais eficiente, competitiva, moderna, numa transição pós-petróleo”, avaliou

Financiamento

Representante da Associação Nacional de Produtores Rurais pela Liberdade, André Bedin Pirajá apontou pontos na regulamentação do mercado de carbono que podem de alguma forma atingir os produtores rurais. Segundo Pirajá, a criação do mercado de carbono incrementará os custos de produção, onerando os produtores rurais. “Uma coisa é fazer isso [incremento] de forma voluntária e outra é obrigatória. Dos 5 milhões de produtores no país, quantos deles têm condições de intensificar a produção, como [investir] na integração Lavoura, Pecuária, Floresta [LPF]?”, questionou.

Pirajá também questionou os juros cobrados em financiamentos para investimentos. “Se é para salvar o mundo, os financiamentos não deveriam ter juros”, afirmou.

Com informações da Agência Senado