Debatedores que participaram de audiência pública sobre o projeto (PL 2.788/2019) que institui a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) divergiram sobre a aprovação da matéria. No debate, que ocorreu nesta sexta-feira (8) na Comissão de Meio Ambiente (CMA), enquanto alguns especialistas apontaram a necessidade de se avançar na legislação para definir a responsabilidade social do empreendedor e estabelecer garantias sociais às populações em risco, outros afirmaram que o texto pode trazer insegurança jurídica e inviabilizar a implementação de projetos.
A relatora da matéria e requerente da audiência, Leila Barros (Cidadania-DF)disse entender que ficou evidente a grande necessidade de se promover segurança jurídica às populações atingidas por barragens, principalmente após as tragédias nas cidades de Mariana e Brumadinho. Ela explicou que o objetivo principal do projeto de lei é criar mecanismos legais para que todas as populações atingidas por barragens, seja na fase de construção, ou nos casos de vazamento ou rompimento, como aconteceu nas cidades de Mariana e Brumadinho, possam reivindicar os seus direitos.
— São estipuladas medidas de reparação em caso de perda de propriedade ou da capacidade de produzir e até na mudança de hábito daquelas populações que precisam ser removidas. O projeto também ilustra a implementação de medidas protetivas para comunidades mais vulneráveis, como são os casos dos indígenas e dos quilombolas — explicou.
O PL 2.788/2019, já aprovado na Câmara, é de autoria do deputado federal Zé Silva (Solidariedade-MG) e foi relatado pelo deputado Rogério Correia (PT-MG). Ao participar da audiência, Correia ressaltou que já há legislação, como a Lei 14.066, de 2020, de autoria da senadora Leila, voltada mais para a preservação do meio ambiente e a questão da segurança das barragens. Para ele, é preciso agora avançar para garantir a segurança social às populações atingidas ou que corram risco de serem atingidas, como já acontece no estado de Minas Gerais.
— A necessidade dos atingidos de barragens é ter um programa que os possibilite ter ressarcimento pelo que possa vir a acontecer ou pelo o que aconteceu, mas que, ao mesmo tempo, sirva de proteção. Ou seja, não é possível que a gente olhe a questão ambiental, que é fundamental, e não olhe a questão social. Ou seja, o meio ambiente não pode ser atingido, o que é correto, mas as pessoas também não.
Para o defensor público federal e membro do Comitê Rio Doce e Brumadinho, João Marcos Mattos Mariano, o projeto atende a população atingida pelas barragens com uma garantia mínima às pessoas atingidas. Ele apresentou como sugestão atenção, principalmente, às comunidades indígenas e quilombolas.
— Do jeito que está hoje, quando acontece um desastre, há uma mobilização para tentar criar uma legislação, mas para as populações que foram atingidas a gente tem uma necessidade muito grande de tentar construir um direito, no caso concreto. Isso sempre depende de mobilizações, de força política, de luta social, mas não deveria ser assim tão sofrido para essas populações, dependendo da boa vontade dos poderes públicos, principalmente do Judiciário.
A coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Tchenna Maso defendeu a aprovação integral do projeto. Para ela é preciso avançar no marco de proteção aos atingidos por barragem já que a legislação atual é insuficiente nesse sentido.
— É impossível você desviar o curso de um rio e não admitir que isso vai causar danos. Que isso vai causar impacto social e ambiental no país onde a população está atrelada à dimensão social e à dimensão ambiental.
A defesa foi reforçada pela Coordenadora do Centro de Direitos Humanos e Empresas (Homa), Manoela Carneiro Roland. Para ela, a voz das pessoas atingidas foi desconsiderada no processo de reparação quando das últimas tragédias ocorridas.
— A correlação de forças nesses territórios é estruturalmente desigual tendo em vista que as comunidades onde tais empreendimentos se instalam costumam ser vulneráveis, totalmente, em todos os níveis, daí a importância de se fixar uma lei ordinária de reconhecimento do conceito de população atingida e seus direitos criando também obrigações aos empreendedores responsáveis por essas barragens.
Insegurança jurídica
Por outro lado, a chefe da assessoria especial de Meio Ambiente do Ministério de Minas e Energia (MME), Ceicilene Aragão Martins acredita que alguns pontos da proposta ainda precisam ter a atenção do legislativo para possíveis ajustes. Ela citou como exemplo a sobreposição e necessidade de definição clara das responsabilidades do setor público e do setor privado na reparação à essas populações atingidas no sentido de se evitar insegurança jurídica.
— Consideramos que o conceito de barragens é generalista, podendo ser adotado por grandes hidrelétricas à barragens de mineração de grande porte, de baixo impacto e com as mesmas obrigações e estrutura de governança. A definição de algumas obrigações deve ter relação com o porte e o impacto dos projetos evitando o incremento de custos adicionais e até mesmo de inviabilidade dos empreendimentos.
A diretora da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (APINE), Josiani Napolitano também defendeu a diferenciação das características de construção, operação e segurança das barragens.
— Diferentes dimensões de empreendimentos requerem formas distintas de fiscalização e penalização. As barragens de usina hidrelétricas são sempre projetadas para não sofrer modificações em suas estruturas civis. E é por isso que essas estruturas são permanentemente monitoradas, seguindo características técnicas rígidas e níveis de confiabilidade e segurança definidos desde o projeto base..
Com informações da Agência Senado